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Administração Municipal

A Administração Fazendária Municipal diante da crise

Roberto A. Tauil – março de 2020.

Dizem que a criatividade humana se destaca nos momentos de dificuldades. Parece até que o ser humano é preguiçoso e fraco por natureza, mas, quando provocado e colocado em risco sua sobrevivência, ele consegue retirar de suas entranhas a inteligência que lhe dá a força necessária para reagir. Hulk que o diga.

Estamos atualmente em crise: a pandemia do novo coronavirus vem exigindo fortes restrições ao direito de ir e vir na tentativa de diminuir os contatos pessoais. Em tal situação, muitas atividades econômicas (ou todas!) sofrem quedas acentuadas de faturamento, a impactar diretamente o desempenho da receita tributária.

Nos Municípios, a arrecadação do ISS deverá sofrer violenta redução. Vários estabelecimentos fecharam as portas, tais como escolas, academias de ginástica, cinemas, entretenimentos e outras. Certas atividades, que não chegaram ao ponto de fechar as portas, sofrerão quedas marcantes de receita, como os hotéis, o transporte coletivo, bancos, construção civil etc.

Neste contexto, não temos dúvidas de que o Poder Público precisa assumir posições fortes de apoio às atividades econômicas, para tentar, na medida do possível, atenuar a grave situação financeira que a maioria dos contribuintes sofrerá pela frente. Chega a ser curioso, porém, que muitos servidores, principalmente os de cargos em comissão, coloca o desempenho da receita acima de qualquer interesse coletivo, até mesmo de risco de vida! É triste quando percebemos a total insensibilidade do servidor perante a condição humana do contribuinte, quando nada tem a ver, no caso, com o interesse da coletividade. E a desculpa é sempre a mesma: cumpro a lei! “Dura Lex sed Lex no cabelo só Gumex”, rá-rá.

De qualquer modo, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional já saiu na frente, instituindo várias facilidades aos contribuintes. A PGFN tomou um conjunto de medidas para suspender atos de cobrança e facilitar a renegociação de dívidas, aproveitando-se das normas expedidas na Medida Provisória n. 899/2019. As medidas de cobrança foram suspensas por 90 dias e foi instituído um parcelamento extraordinário para esse momento de crise. Durante 90 dias, a PGFN não encaminhará CDA para protesto em cartório, além de não excluir parcelamentos contratados por motivo de atraso nos pagamentos. Os prazos de impugnações pelos contribuintes também foram suspensos pelo mesmo período, ou seja, não será considerado intempestivo o recurso que atrasar até 90 dias do prazo normal.

E no momento em que escrevo este artigo recebo informação de que o Comitê Gestor do Simples Nacional prorrogou o prazo de pagamento dos tributos federais das empresas cadastradas no Simples Nacional. Para dar um exemplo, a base de cálculo do mês de março/2020, com vencimento original que seria em 20 de abril de 2020, teve o seu vencimento estendido para 20 de outubro de 2020.

Cabe lembrar de que a prorrogação dos pagamentos do Simples Nacional se refere somente aos tributos federais. Sendo assim, caso os Municípios queiram também conceder a mesma prorrogação, serão obrigados a aprová-los através de decreto e encaminhar solicitação à Receita Federal para incluir o ISS nas guias com prazos dilatados.

Os Municípios têm agora uma excelente oportunidade para transferir de vez vários serviços e controles para a Internet. Chega a ser ridículo nos dias de hoje a necessidade de o contribuinte ter que comparecer na repartição fiscal para, por exemplo, requerer uma certidão negativa, requerer a emissão de guia de pagamento de tributo, ingressar com impugnação e assim por diante. Em geral, os sistemas ou programas de controle informatizado da Administração Fazendária são dotados de mecanismos que possibilitam diversos serviços pela Internet. O problema está na tomada de decisão dos gestores, que, francamente, patinam, se omitem, tergiversam e não decidem. Parece que eles têm medo de que algo não vai dar certo, ou, então, têm um prazer mórbido de ver o salão do atendimento lotado, como se fossem donos de supermercados.

Todavia, temos bons exemplos e alguns até já antigos. A Prefeitura de Jundiaí, em 2016, publicou a Instrução Normativa n. 02 que, literalmente, manda os auditores tributários para casa. Vão ficar em casa e trabalhando! Para tanto, a Prefeitura fornece computador e outros equipamentos, com acesso direto nos sistemas de controle da área fazendária. Ao utilizar sua senha e login para entrar no sistema, a chefia toma conhecimento imediato do fato e, assim, controla à distância as atividades do auditor. A IN chama isso de “Regime de Teletrabalho”, nome de mau gosto para uma ótima ideia.

Até hoje ninguém conseguiu me convencer da necessidade do interessado ter de comparecer na repartição para obter alvará de funcionamento. Por que não permitir o uso da Internet? E, afinal, por que a Prefeitura precisa de documentos originais se, ao invés, poderia arquivar os documentos “escaneados”? Em outras palavras, por que a Prefeitura precisa de arquivos físicos, de papéis, quando poderia usar o arquivo eletrônico, com a segurança de arquivar os documentos nas nuvens?  

E emissão de Certidão Negativa? E emissão de guias de pagamento (inclusive das famigeradas “taxas de expediente”, a maioria inconstitucional!). Hoje em dia, as notificações são eletrônicas, podendo ser enviadas pelo Correio ou por e-mail e coisas parecidas. Basta que a Prefeitura regulamente o assunto. Vamos permitir ao contribuinte fazer ingresso de impugnação por meio digital, por que não?

Enfim, vamos tentar tirar de momento tão trágico alguma coisa de útil e que sirva para sempre.