Relembrando:
“Ato Administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria” (Helly Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro).
“Ato administrativo é a norma concreta, emanada pelo Estado, ou por quem esteja no exercício da função administrativa, que tem por finalidade criar, modificar, extinguir ou declarar relações jurídicas entre este (o Estado) e o administrado, suscetível de ser contrastada pelo Poder Judiciário” (Lúcia Valle Figueiredo, Curso de Direito Administrativo).
Não confundir Ato Administrativo com Fato Administrativo. Este último cumpre etapas do primeiro, como bater o ponto, atender ao contribuinte, arquivar um documento, dar juntada aos autos de um processo etc.. Mesmo assim, não esquecer que um mero fato administrativo pode ter consequências jurídicas para o servidor, para a Administração e para os contribuintes.
São atos administrativos fiscais, entre outros:
Outros tipos de ato administrativo:
Requisitos do Ato Administrativo:
A produção de um ato administrativo exige obediência a determinadas normas, ou o cumprimento de formalidades essenciais à sua validade. Abaixo, alguns requisitos necessários à sua formação:
Vícios dos Atos Administrativos
No Direito Civil, os vícios dos atos privados se referem, basicamente, aos elementos: sujeito (ou competência), objeto e forma. No Direito Administrativo, os vícios podem atingir os seguintes elementos: competência (sujeito), forma, objeto, motivo e finalidade.
Os atos administrativos com vícios podem ser:
1 – Nulos, quando não poderão ser convalidados ou quando a lei assim declare;
2 – Anuláveis, quando o ato poderá ser convalidado ou quando a lei assim declare.
Convalidação (ou Saneamento) é o ato administrativo pelo qual é suprido o vício existente em um ato, com efeitos retroativos à data em que este foi praticado.
Segundo a maioria da doutrina, a convalidação é ato discricionário da autoridade pública. Sendo assim, até mesmo um ato praticado por pessoa incompetente poderia ser convalidado, posteriormente, por ato discricionário da autoridade competente para praticá-lo. Pedimos vênia por discordar de tal posição, pois a discricionariedade não deve ser encarada como poder absoluto da autoridade, a ponto de convalidar um ato irremediavelmente nulo e absolutamente ilegal. Não depende, assim, de opção da Administração Pública a possibilidade de aprovar ou não um ato ilegal. A discricionariedade não pode ser usada ao talante da autoridade; deve rigorosamente respeitar a lei.
O mestre Celso Antonio Bandeira de Mello define discricionariedade desta forma: “a margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica, diante do caso concreto, segundo critérios subjetivos próprios, a fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema legal”.
Neste sentido, possível dizer que os atos administrativos podem ser vinculados, ou seja, há somente um único caminho a ser seguido pelo autor do ato diante da objetividade prevista na lei, ou, então, “discricionários”, quando o autor pode ter certa liberdade de avaliação ou de decisão em face de certa ‘subjetividade’ da lei, deixando claro que discricionariedade não é forma de interpretação da lei, mas, sim, uma alternativa de decisão por ela permitida.
Todavia, em diversas situações o próprio poder discricionário é de difícil percepção. Veja este exemplo: se a lei estabelece textualmente que os juros moratórios são de “1% ao mês ou por fração de atraso no mês”, para todos os créditos tributários vencidos, o servidor, aparentemente, não possui qualquer liberdade de firmar outro critério para cálculo. Sendo assim, num caso de débito com 45 dias de atraso (um mês completo e fração de outro mês), cobraria 2% de juros de mora? Ou poderia lançar os juros tendo por base cada dia de atraso (0,033 x 45 dias)? Este exemplo foi proposital, porque já tivemos em mãos as duas situações expostas. Mesmo que a lei não defina o percentual diário dos juros moratórios, citando apenas a base de cálculo mensal, seria possível dizer que a menção de “1% ao mês” permitiria a aplicação dos juros diários, na base de 0,033%? E, neste caso, poderia o regulamento (decreto) melhor dispor sobre o assunto? Entendemos que sim, mas o tema gera controvérsias, principalmente em razão da maneira pela qual a lei é redigida. Em alguns Municípios (como acontece na Receita Federal do Brasil) as leis são claras em estabelecer o percentual diário dos juros, mas os dispensam quando o pagamento for efetuado dentro do mês do vencimento, cobrando, neste caso, somente a multa de mora. Ainda sobre este exemplo, outro problema é que muitos sistemas informatizados adotam a cobrança diária (0,033%), mesmo que a lei dite “1% ao mês e por fração de atraso no mês”. Pergunta-se: estaria o sistema descumprindo a lei?
Os principais vícios de competência são:
A – Usurpação de função: quando a pessoa que pratica o ato não foi, por qualquer modo, investida no cargo, emprego ou função. Ela se apossa por conta própria do exercício da função. Em tais casos, o ato administrativo praticado por tal pessoa é nulo, não podendo ser convalidado. Trata-se de nulidade absoluta;
B – Excesso de poder: quando o servidor público excede os limites de sua competência. Exemplo: servidor estranho ao quadro de carreira de Fiscal (ou similar) lavrar auto de infração contra o sujeito passivo. Além de ser ato de nulidade absoluta, o servidor poderá responder por improbidade administrativa;
C – Função “de fato”: situação parecida com a do excesso de poder, o servidor que pratica o ato está irregularmente investido no cargo, mas a sua situação tem toda a aparência de legalidade. Exemplo: servidor suspenso do cargo, mas continua exercendo a função; servidor licenciado, mas que continua exercendo externamente a sua função. Nulidade absoluta e indícios de improbidade administrativa.
O objeto do ato administrativo deve ser: lícito, possível, moral e determinado. Qualquer transgressão a esses elementos implicará em vício. Deste modo, serão vícios insanáveis:
- quando o objeto contrariar a lei;
- quando o objeto for impossível de ser realizado;
- quando houve imoralidade no ato administrativo (despacho feito por encomenda, por exemplo);
- quando houver incerteza em relação ao destinatário, ao tempo e ao lugar.
Todavia, nada impede o saneamento de alguns erros sanáveis, como, por exemplo, um erro de grafia no nome do sujeito passivo, erro no número do endereço do sujeito passivo, CNPJ incorreto e outros.
É considerado vício insanável utilizar um tipo de ato administrativo quando deveria ser outro. Usar Portaria quando o correto seria um Decreto; usar Notificação quando o correto seria Intimação (este é um erro muito comum na Administração Fazendária Municipal).
Em situações frequentes, os Fiscais Municipais costumam dar ordens verbais aos contribuintes, mas, importante saber, que ordem verbal não substitui o ato formal, não possuindo aquele a força jurídica que este possui. O Agente Público atua na formalidade dos seus atos, notificando, intimando, despachando, autuando, tudo através de documentos escritos e preenchidos de acordo com as exigências legais. Evidente, porém, que uma simples instrução no atendimento, uma explicação sobre a maneira que o contribuinte deva proceder, não chegaria ao ponto de gerar um ato administrativo, e, sim, um fato administrativo. O servidor deve perceber a diferença entre uma coisa e outra. Intimar verbalmente o contribuinte para entregar documentação fiscal não tem valor jurídico. Autuar “de boca” não tem valor algum. Responder verbalmente uma consulta formal, sem seguir os trâmites procedimentais, não dá à resposta a devida validade jurídica.
Tomamos a liberdade de dizer que o publicista José Cretella Júnior foi o autor que melhor explicou os vícios relativos à finalidade do ato administrativo. Diz o mestre que um vício irreparável ocorre quando o ato se afasta do “espírito da lei”, quando aquilo que inspirou o autor não se coaduna com a intenção do legislador. O autor distorce o objetivo da lei tendo por fim alcançar um resultado que lhe satisfaça pessoalmente. Seria uma forma de burlar a intenção da lei.
José Cretella Júnior define assim o desvio de poder: “desvio de poder é o uso indevido, que a autoridade administrativa, nos limites da faculdade discricionária de que dispõe, faz da ‘potestas’ que lhe é conferida para concretizar finalidade diversa daquela que a lei preceituara”.
Alguns exemplos de vícios relativos à finalidade: perseguição a um contribuinte, com ações fiscais permanentes, por se tratar de um adversário político; transferência ex officio de um servidor por motivos particulares de inimizade; formular um edital já totalmente preparado para atender determinado participante.
No entanto, como bem diz Cretella, “a prova do desvio de poder é difícil de fazer-se. A autoridade age, quase sempre, com extrema cautela, acobertando-se sob a máscara da legalidade”.
Lamenta-se, e muito, que a maioria dos Municípios não possui leis que tratam, especificamente, dos atos administrativos. Contudo, temos a Lei Federal n. 4.717/65 que regula os procedimentos concernentes às ações populares, e que dispõe sobre os vícios dos atos administrativos. Além disso, a União dispõe da Lei n. 9.784/99 que institui o Processo Administrativo Federal.
Sem fugir das normas estabelecidas na referida lei, os Municípios deveriam instituir suas regras e classificação dos seus atos administrativos. Já seria um avanço.
Roberto A. Tauil
Dezembro de 2014.