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Administração Municipal

Funções de Confiança e Cargos em Comissão

Um prezado servidor municipal, que ocupa o cargo de Fiscal “Faz Tudo” (o cargo dele é Fiscal de Obras, Posturas e Meio Ambiente) enviou-me mensagem na qual pergunta se o Chefe da Fiscalização pode ser nomeado livremente pelo Prefeito, sem pertencer ao quadro de carreira.

Por ser assunto de interesse de vários Servidores Municipais, transcrevo abaixo a minha resposta:

Lastimável a situação encontrada em vários Municípios, de desrespeito à Constituição Federal! Vou tentar resumir o assunto da pergunta.

No serviço público, temos três expressões distintas: Cargo, Função, Emprego.Para não estender o artigo, comentaremos apenas os Cargos e Funções.

Cargos Públicos

Cargo de carreira, ou de provimento efetivo, é definido em lei e exerce funções (atividades) específicas ao cargo, conforme descrição na lei. Os ocupantes de cargos de carreira são, obrigatoriamente, concursados, ou, então, aqueles que já exerciam a atividade anteriormente à vigência da atual Constituição Federal,os quais, pelo passar do tempo, são poucos os que ainda estão no batente.

O concurso público estabelece critérios de seleção, exigências e requisitos, e uma delas, necessariamente, é a formação técnica ou de ensino, justamente para manter um padrão de qualidade ao serviço que será exercido. Por
exemplo, “Fiscal de Obras” deveria ter formação técnica específica (Engenheiro, Arquiteto ou, pelo menos, Técnico em Edificações).

Temos, porém, outra espécie de Cargo: os chamados Cargos em Comissão,ou de confiança. Os Cargos em Comissão são unidades completas de atribuições previstas na estrutura organizacional e são independentes dos Cargos de provimento efetivo. A dizer assim que o campo de abrangência dos Cargos em Comissão claramente se enquadra nas atividades de direção,chefia e assessoramento superiores do grupo de confiança, restrita dos dirigentes do Poder Executivo.

O Cargo em Comissão, independentemente da forma de provimento amplo ou restrito é um conjunto de atribuições de direção, chefia e assessoramento, sem qualquer correlação com a estrutura de cargos efetivos, de carreira. Ou seja, este cargo não pode estar intrinsecamente ligado às funções de um cargo de provimento efetivo. O elemento central do Cargo em comissão é a questão confiança política.

Merece registro o conceito de cargo estabelecido no art. 3º e parágrafo único, da Lei Federal n. 8.112/90:

“Art. 3º Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.
Parágrafo único. Os cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são criados por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão”.

Observa-se, no parágrafo único, a classificação dos cargos, em efetivo ou em comissão.

Nas Prefeituras, são comuns os Cargos em Comissão, tais como Chefe de Gabinete, Secretário, Procurador-Geral, Secretário Adjunto, Assessor Especial e alguns outros. A criação de Cargos em Comissão está prevista em lei e deve ser parcimoniosa e com uso de critérios rígidos, a fim de não conflitar com as atividades normais dos ocupantes de cargos de carreira. Caso contrário, a criação de Cargos em Comissão seria um ardil para burlar a obrigatoriedade de concurso público e efetividade das carreiras.

A prática de criação indiscriminada de cargos em comissão já foi alvo do Supremo Tribunal Federal, frente a um caso concreto de criação de cargos comissionados na Câmara Municipal de Blumenau. No caso, o STF afirmou o caráter de exceção na criação de cargos em comissão, reputando desatendido o princípio da proporcionalidade, pois dos 67 servidores da Câmara, 42 exerciam cargos de confiança, enquanto apenas 25 eram servidores efetivos. Em outra decisão, o Pleno do STF julgou procedente, por unanimidade, a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.706 (15/08/07), relatada pelo Ministro Gilmar Mendes, declarando a inconstitucionalidade de norma que criou cargos em comissão para atribuições não destinadas a direção, chefia ou assessoramento.

Funções

Função não é um cargo. Temos dois tipos de Funções:

I - as que são exercidas por servidores contratados temporariamente em razão do caráter de urgência na contratação, e que a necessidade de contratar seja de excepcional interesse público. Não são concursados (exatamente pela urgência de contratação). A atual ideia de contratar médicos estrangeiros caberia, talvez, nesta hipótese.

A Lei Federal n. 8.745/93, e suas alterações, indica como casos de excepcional interesse público:

a) assistência a situações de calamidade pública;

b) combate a surtos endêmicos;

c) realização de recenseamentos e outras pesquisas estatísticas pelo IBGE;

d) admissão de professor substituto e professor visitante;

e) admissão de professor e pesquisador visitante estrangeiro;

f) atividades especiais nas Forças Armadas;

g) atividades de identificação e demarcação desenvolvidas pela FUNAI;

h) atividades finalísticas em Hospital das Forças Armadas;

i) atividades de pesquisa e desenvolvimento de produtos sob responsabilidade do CEPESC;

j) atividades de vigilância e inspeção no âmbito do Ministério da Agricultura e do Abastecimento;

k) atividades desenvolvidas no âmbito do SIVAM e SIPAM;

l) atividades técnicas especializadas no âmbito de projetos previstos no plano plurianual.

Os Municípios que queiram contratar servidores temporários teriam de estabelecer, por suas leis próprias, as hipóteses em que essa contratação seria possível e o regime jurídico em que a mesma se daria. Da mesma forma que a União providenciou, conforme a lei mencionada acima. Mas a maioria dos Municípios nem se preocupa com isso.

II - as que são exercidas em caráter permanente, mas não são cargos de carreira. São funções do tipo de chefia, direção e assessoramento. No caso das Prefeituras, o Prefeito pode nomeá-los, ou substituí-los livremente, mas estas funções são exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargos efetivos, e aqueles nomeados para exercer tal função fazem jus a uma gratificação de função. Por evidência, quando se diz que o Prefeito pode nomear livremente, entende-se que o ocupante tem que ser do quadro de carreira que o servidor irá dirigir, chefiar ou assessorar. Aliás, em vários Municípios as leis locais determinam que o Prefeito faça a sua escolha com base numa lista tríplice de candidatos indicados pelo próprio quadro.

O art. 37, V, da Constituição Federal diz assim:

“as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”.

Observa-se que a norma acima trata de duas atividades: função de confiança e cargo em comissão. Enquanto as funções de confiança serão “exercidas”, os cargos em comissão serão “preenchidos”, conforme o dispositivo de que se trata. As funções serão exercidas porque são acréscimos de responsabilidades do servidor que a exercer, em vista da natureza de comando ou de assessoria que lhe foi atribuída, portanto, uma dose maior de responsabilidade em comparação às suas atividades normais. Já os cargos em comissão são apenas preenchidos, pois são cargos isolados, previstos na estrutura organizacional, mas independentes dos cargos de carreira ou de provimento efetivo.

E a norma constitucional citada deixa claro que as funções de confiança serão sempre exercidas por servidores ocupantes de cargo efetivo. Já os cargos em
comissão, serão preenchidos, de preferência, por servidores de carreira, mas,admite-se o preenchimento por não servidores, de acordo com os casos,condições e percentuais mínimos estabelecidos em lei. Que lei? No nosso caso, em lei municipal, que geralmente não existe.

Entende-se, desta forma, que a função de confiança é um encargo de direção,chefia e assessoramento atribuído a servidor ocupante de cargo efetivo. Ou seja, uma adição de atribuições, ou responsabilidades, àquelas que lhe são determinadas normalmente pelo exercício do cargo que ocupa. E neste sentido, evidente que é preciso manter uma correlação com a natureza técnica do cargo de carreira, pois incabível seria designar estranhos para assumirem funções de comando ao quadro. Ademais, se não houver essa estreita correlação entre as competências do quadro e das funções de direção, chefia e assessoramento, por certo estaríamos diante de atribuições tão distintas que a função constituiria um novo cargo. E como já foi visto, função não é um cargo.

A função de confiança, portanto, é atribuição exclusiva do quadro de carreira,sendo, então, designado um de seus servidores, premiado pelo seu histórico funcional, pela experiência adquirida ao longo de sua carreira, pela capacidade comprovada que o habilite ao exercício de uma função gerencial, incluindo força de liderança, conhecimentos de gestão e habilidades no trato com pessoas. Um bom Fiscal, às vezes, não será um bom chefe, pois aptidões de chefia são inerentes à personalidade da pessoa. É preciso saber escolher, e quem melhor para escolher do que os próprios servidores da categoria?
Enfim, a minha resposta à consulta é NÃO! Função de direção, chefia e assessoramento de um quadro de carreira tem que ser ocupada por servidor do quadro. Os estranhos que fiquem com os Cargos em Comissão, assim mesmo, em termos.