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Finanças Municipais

A Prescrição no Parcelamento do Débito Tributário

Roberto A. Tauil – março de 2020.

(publicado originalmente em janeiro de 2015)

Uma Prefeitura fez a seguinte consulta: O contribuinte devia o IPTU de 2007. Em 2008, parcelou o débito em 60 parcelas mensais iguais e consecutivas, com vencimento inicial em agosto de 2008 e final em agosto de 2013. Pagou as três primeiras parcelas do carnê e ficou devendo o resto. Ocorre que em 2012 ele pagou as parcelas 40 a 44 do carnê. E nada mais foi pago. Pergunta-se: A) Já ocorreu a prescrição do débito integral? B) O pagamento das parcelas 40 a 44 poderia ser entendido como um “ato inequívoco ainda que extrajudicial que importe em reconhecimento do débito pelo devedor” (parágrafo único, IV, do art. 174 do CTN)?

Abaixo, a nossa opinião.

Quando o contribuinte efetua o parcelamento do seu débito, diz-se que a contagem do prazo prescricional foi interrompida. Ou seja, não foi suspensa, com possibilidade de reiniciar sua contagem; houve interrupção e o tempo passado não importa mais. Caso o contribuinte deixe de pagar o parcelamento, começa uma nova contagem da prescrição a partir do zero. Importante: interrupção não é a mesma coisa que suspensão.

Exemplo da posição do Superior Tribunal de Justiça – 2ª Turma:

“1. O parcelamento da dívida tributária enseja a interrupção - e não a suspensão - do prazo prescricional, o qual recomeça a contar por inteiro a partir do inadimplemento. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg no REsp 1482236/SP).

Mas, qual será o marco inicial do início da contagem da prescrição? Da data da inadimplência relativa ao parcelamento? Ou da data em que o Fisco determinou o cancelamento do parcelamento? Às vezes, o contribuinte deixa de pagar suas mensalidades e o Fisco somente percebe o fato meses (ou anos) depois, promovendo, então, a formalidade do cancelamento do parcelamento, mediante procedimento administrativo e notificação ao contribuinte.

Na decisão acima da 2ª Turma do STJ parece claro que a contagem se inicia a partir do inadimplemento. A 1ª Turma do STJ sustenta o mesmo entendimento, conforme abaixo:

“1. O parcelamento suspende a exigibilidade do crédito tributário (art. 151, VI do CTN) e, por representar manifestação de reconhecimento do débito pelo devedor, interrompe a contagem da prescrição (art. 174, parágrafo único, IV do CTN), que torna a fluir integralmente no caso de inadimplência. Precedentes do STJ. 2. Agravo Regimental do contribuinte a que se nega provimento” (AgRg no AREsp 237016 RS 2012/0205670-5).

“Torna a fluir integralmente no caso de inadimplência”, ou “recomeça a contar por inteiro a partir do inadimplemento”. Assim, ambas as Turmas do STJ entendem que o marco inicial da contagem da prescrição ocorre a partir do momento em que o contribuinte se torna inadimplente.

Esse posicionamento vem do tempo do Tribunal Federal de Recursos, cuja Súmula n. 248, de 1987, dizia o seguinte:

“O prazo da prescrição interrompido pela confissão e parcelamento da dívida fiscal recomeça a fluir no dia que o devedor deixa de cumprir o acordo celebrado”.

Todavia, em que momento o devedor passa a ser considerado inadimplente? Segundo a Larousse Cultural, adimplente é aquele que cumpre, em tempo hábil, as obrigações de um contrato. E o contrato de parcelamento segue, obrigatoriamente, as determinações da lei local. Como se sabe, o art. 155-A do CTN estabelece que “o parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica”. Há, portanto, necessidade de lei específica do ente político para instituir o parcelamento, exigência que alcança, é evidente, os Municípios. Neste teor, a maioria das leis de parcelamento determina o seu cancelamento automático quando uma ou duas ou três parcelas (a depender de cada lei) não são quitadas nos prazos estabelecidos. Sendo assim, a própria lei já define o momento do descumprimento do acordo.

Neste sentido, a nossa opinião é de que a contagem da prescrição dá início quando a lei local considera o contribuinte inadimplente a provocar o cancelamento do acordo. Estamos, pois, a dizer que a falta de pagamento de um mês pode não significar, ainda, a inadimplência do parcelamento, porque a lei local somente considera cancelado o programa de pagamentos se, por exemplo, houver três parcelas consecutivas vencidas e não pagas.

Essa interpretação tem uma lógica: se a lei local estabelece o cancelamento do acordo quando, por exemplo, três parcelas consecutivas não forem pagas, não poderia o Fisco tomar qualquer medida de cobrança judicial enquanto esse atraso não for consumado, mesmo que haja inadimplência de duas parcelas.

Num contrato de longo prazo, por exemplo, de 60 meses, é comum o devedor atrasar o pagamento de uma parcela, mas não por isso será considerado inadimplente. Aperto financeiro momentâneo, esquecimento, viagem, diversos motivos podem provocar o atraso no pagamento de uma parcela. Por isso, as leis, em geral, admitem atrasos ocasionais sem que o devedor perca o direito ao seu parcelamento. Em outras palavras, o devedor ainda não é considerado inadimplente.

Para citar um exemplo, a Lei Federal nº 10.189/2001 prescreve no § 6º do artigo 2:

“§ 6o A falta de pagamento de duas prestações implicará a rescisão do parcelamento e a exclusão da pessoa jurídica do Refis”.

Deste modo, não seria inadimplente o devedor que deixasse de pagar uma parcela. A rescisão do contrato somente se daria quando o devedor acumulasse atraso de duas parcelas.

Cabe salientar a irrelevância do momento em que o Fisco formaliza o cancelamento do contrato, para fins de contagem de prescrição. A demora da Administração Pública em proceder formalmente o cancelamento não pode prejudicar a contagem da prescrição, com prejuízo do devedor. Se assim fosse possível, concluir o contrato ao talante do Fisco, quanto maior a demora, mais tempo teria a Administração para cobrar judicialmente o débito parcelado.

Exemplo:

IPTU de 2007 foi parcelado em 60 parcelas mensais em 2008. O devedor deixa de pagar a partir de janeiro de 2009. A lei Municipal considera inadimplente aquele que deixa de pagar 3 parcelas consecutivas. Deste modo, a prescrição começa a fluir a partir de abril/2009. Mas, a Administração Fazendária somente cancela o contrato e notifica o devedor em janeiro de 2010. E pensa que o marco inicial da contagem da prescrição será neste mês de janeiro de 2010. Ledo engano, a prescrição já voa desde abril de 2009.

Pois bem, a consulta descrita no início do artigo traz uma situação nova. O contribuinte deixa de pagar, a Administração nada faz e o contribuinte, por qualquer razão misteriosa, resolve, lá na frente, pagar 5 parcelas do carnê, com vencimentos em 2012. A pergunta: Esses pagamentos provocaram o reativamento do contrato de parcelamento? E sendo assim, a prescrição passa a contar a partir do mês seguinte ao último de tais pagamentos em 2012?

A nossa resposta é um não contundente. A lei deste Município define como inadimplente aquele que não paga 3 parcelas consecutivas. Ou seja, o contrato já está, nos termos da lei, cancelado desde novembro de 2008. A verdade é que o Fisco dormiu no ponto, nada fez de concreto e deixou o contribuinte de posse do carnê que, juridicamente, não teria mais valor. Não se admite aí a aplicação do art. 174 do CTN, porque o prazo quinquenal da prescrição já se esgotara.

A piorar, o contribuinte pagou parcelas de um débito já prescrito. Poderia até requerer a devolução. Ademais, o art. 202 do Código Civil alerta que a interrupção da prescrição somente poderá ocorrer uma vez. E esta já ocorreu quando o parcelamento foi aprovado.